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  • Desconstruindo Una, por Una

    Sinopse: West Yorkshire, 1977. Um assassino em série está aterrorizando o pequeno condado inglês, e a polícia encontra dificuldade em resolver o caso – mesmo tendo interrogado o assassino (sem o saber) nada menos que nove vezes. Enquanto a história se desenvolve ao seu redor, Una, então com 12 anos, vivencia uma série de atos violentos pelos quais se culpa. Por meio de um entrelace de imagem e texto, Descontruindo Una examina o significado de se crescer em meio a uma cultura na qual a violência masculina não é punida ou questionada. Com uma retrospectiva de sua vida, Una explora sua experiência e se pergunta se algo realmente mudou, desafiando a cultura que exige que as vítimas de violência paguem por ela.





    Autora: Una

    Tradutora: Carol Christo

    Editora: Nemo

    208 páginas 

    Apesar de ser um quadrinho, o tema trazido por Desconstruindo Una faz dele um livro que só conseguimos ler aos poucos. É denso e forte e, muitas vezes, parei a leitura para respirar, para sair daquele local de dor e de sofrimento onde a leitura me colocava. Mesmo assim, a leitura de Desconstruindo Una é altamente necessária e atual. Fala da violência contra a mulher e do sofrimento que se é viver num mundo machista e misógino como o nosso. A história se passa entre os anos de 1975 e 1980, anos que coincidem com o fim da infância e os primeiros anos da adolescência de Una, em Leeds, Inglaterra. Nesta região os habitantes conviveram com o terror trazido por um psicopata que violentava e matava mulheres, Peter Sutcliffe, que ficou sendo conhecido como o Estripador de Yorkshire. Ele foi acusado por matar pelo menos trinta mulheres e tentar matar outras sete.



    Apesar da brutalidade dos crimes cometidos, a polícia foi lenta e incompetente ao tentar solucionar o crime e este maníaco só foi capturado cerca de cinco anos depois. O foco da polícia, bem como das pessoas de um modo geral, era julgar ou avaliar a moral das mulheres atacadas, isto porque o foco do serial killer era mulheres que se prostituíam ou mulheres de “moral duvidosa”.

    Neste cenário de violência e misoginia, Una cresce. Infelizmente ela não se torna incólume a esta brutalidade. O abuso também vai fazer parte de sua vida. Não apenas uma, mas várias vezes. Escamoteado nas figuras masculinas próximas ou desconhecidas, o abuso faz ela sentir a dor de ser vulnerável, de ser mulher, de ser vítima. E, mais ainda: de ser desacreditada. Porque muitas vidas poderiam ter sido salvas se as pessoas fossem ouvidas, se o julgamento moral não fosse mais valioso que uma vida.

    O relato trazido por Una é um relato que representa várias mulheres. Não é à toa que ela escolheu esse pseudônimo. Una significa única, como se ela representasse a categoria mulher, como se fosse todas nós, porque sabemos que a violência está ai, bem perto e sim, somos todas vulneráveis. Infelizmente.


    A estética trazida por essa graphic novel é diferente dos quadrinhos tradicionais. Não temos a ordenação dos quadros, lado a lado, como estamos acostumados. A narrativa é apresentada numa dualidade texto-imagem muito bem equilibrada. Os traços são suaves, delicados, na sua maioria em preto e branco ou com poucas cores e linhas finas. Neles sentimos a fragilidade e a inocência de uma menina que está virando mulher e que expressa a sua dor, a sua vulnerabilidade e tristeza.


    Mas Una recomeça, se reconstrói através da palavra. Que precisa ser dita, ser ouvida, pensada, refletida. Acho que este é o grande mote deste livro e da luta contra a violência e a misoginia. Ao final da narrativa a autora ainda apresenta um posfácio e várias referências e números nacionais a internacionais de ajuda a vítimas de abuso.

    É preciso falar, é preciso trazer este assunto tão indesejado e forte para livros, revistas, para a Literatura. Afinal, esta é uma das funções da arte: Pensar a vida, para agir sobre ela e finalmente, modificá-la.

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