Carta Náutica das Desimportâncias, Fabíola Rodrigues
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Olá amigos leitores, tudo bem com vocês? Cá estou novamente para falar de uma coisa que adoro: poesia. Confesso que é um gênero que eu leio pouco, apesar de gostar e, por isso, amei a oportunidade de conhecer a poesia da Fabíola Rodrigues. Eu costumo dizer que a poesia não é lida, não é decodificada de forma racional, ela é muito mais sentida e percebida. Ler poesia é um encontro de sentires, é uma leitura que se amplia e vai além das palavras ali deixadas, pois termina sendo um encontro com você mesma e com o poeta. Mas, filosofias e elucubrações poéticas à parte, vamos ao livro, né?
Carta Náutica das Desimportâncias é o primeiro trabalho de Fabíola Rodrigues como poeta e escritora, embora ela já tenha publicado antes em algumas antologias. E essa estreia é muito bem marcada por uma poesia leve, porém forte, que traduz sentimentos diversos, bem delineados e principalmente revela um olhar de observadora do ambiente, num quadro bem pintado com as tintas da poesia. Boa parte do livro foi escrito no período em que a autora esteve na África, mais especificamente em Guiné-Conacry e Moçambique, no período de 2011 a 2015.
Podemos assim encontrar a África e suas nuances, sua cultura, suas cores e cheiros através dos versos de Fabíola, que de uma forma muito pessoal e ímpar, descreve um espaço muito heterogêneo, mas, ao mesmo tempo, de uma doçura homogênea que circunda todo o livro. É como se a cidade, o espaço e toda a diversidade, riquezas, alegrias e tristezas que ele emana se personificassem, fossem um homem, uma mulher, uma criança. Isso fica bem claro no poema Despedida:
Conakry, terei saudade dos seus olhos baços?
Terei saudade desse rochedo,
da orla triste,
da sua espuma enfadonha esbaforida?
Terei saudade do futebol dos meninos
no fim da tarde?
Se me chama em sonho, Conakry
Eu volto
Não irei desamparar seus olhos baços
Abro os meus braços num amplexo largo
Sei que volto, Conakry.
Fabíola tem um amplo domínio da linguagem e brinca com ela para expressar as mais diferentes emoções. Com um vocabulário rebuscado e com uma afiada habilidade nos jogos linguísticos, ela usa as palavras de forma pontual, única, precisa, a fim de traduzir nelas as suas impressões e também de dar ao poema uma forma só sua.
Mas não é só de África que esta “carta náutica” se revela. Fabíola também traz um pouco de si e revela uma feminilidade, uma sensualidade sutil, mostrando seus sentires, seus desejos e seu fazer poético também como mote para a sua escrita. A palavra é o seu objeto, é na palavra que ela se encontra, matéria-prima de tudo o que se mostra.
“Eu alucino, eu me lambuzo
eu gozo com a palavra
eu me locupleto na luxúria de todas as palavras
que cabem
e que dançam
e que se excitam na minha boca”.
(trecho do poema Palavra de Coco)
Fica claro nos versos da poeta as influências de Manoel de Barros e de Mia Couto, mas também há a riqueza de uma metalinguagem que reinventa-se na letra de outros poetas, como no poema Confissão Poética, onde a autora inspira-se no Poema de Sete Faces de Drummond.
Por fim, posso dizer que Fabíola nos enleva e seduz nessa viagem a lugares tão distantes como a África e ao mesmo tempo tão próximos quanto dentro de nós mesmos. E, como em toda poesia de qualidade, Carta Náutica das Desimportâncias é um texto a ser lido e relido, degustado vagarosamente com muito prazer e ternura.
P.S: Resenha postada originalmente em: http://www.minhavelhaestante.com.br/2016/06/a-convite-ilmara-fonseca-carta-nautica.html
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