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  • Flores do Cárcere, Flávia Ribeiro de Castro.

    É dócil um corpo que pode ser submetido, que pode ser utilizado, que poder ser transformado e aperfeiçoado. [...] Nesses esquemas de docilidade, em que o século XVIII teve tanto interesse, o que há de tão novo? Não é a primeira vez, certamente, que o corpo é objeto de investimentos tão imperiosos e urgentes; em qualquer sociedade, o corpo está preso no interior de poderes muito apertados, que lhe impõem limitações, proibições ou obrigações. 

    FOUCAULT, Michel. Os corpos dóceis. In: ________. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 2. ed. Petrópolis: Vozes,1983



    Depois de ler o livro de Flávia Ribeiro de Castro não tive como não lembrar de Foucault, de Educação e tantas outras coisas que li, vi e aprendi na faculdade e na vida. É um livro doce e ao mesmo tempo amargo. Um livro que fala da realidade nas prisões femininas, mas principalmente e, para além disso,  que fala da vida dessas mulheres. Fala de seus sonhos, realidades, experiências e de como a prisão imprime a sua marca indelével em suas vidas e em seus corações. 

    O meu encontro com este livro foi muito encantador. Recebi um e-mail super fofo do Felipe Arruda, que é responsável pela divulgação do livro. Neste e-mail ele me mandava um capítulo do livro e oferecia um exemplar para  a resenha. Assim que li fiquei muito interessada. O tema das prisões é um assunto que sempre me despertou interesse  e que sempre foi muito estudado na faculdade. Respondi ao e-mail e em pouco tempo o Felipe me enviou o livro. 

     Flores do Cárcere conta-nos a experiência real de Flávia dentro de uma penitenciária em Santos. Nesse curto período em que conviveu com estas mulheres, Flávia pode trazer-nos através de sua escrita um pouco da vida de cada uma delas e dos olhares de mãe, mulher, esposa, filha, etc. O projeto desenvolvido por Flávia,  chamado Educação para Convivência, tinha como objetivo inicial desenvolver os valores de paz e de inclusão dentro da cadeia. 

    Com atividades como a produção de um jornal, um coral e um desfile de beleza, Flávia trouxe para as detentas a possibilidade de se reencontrarem com o humano e intrínseco de cada uma delas, perdido na condição de "detento". Mostrar que aquele corpo "docilizado" e marcado pela homogeneização da cadeia era um corpo vivo, pulsante, cheio de histórias e de possibilidades. Flávia nos mostra as flores crescendo em meio ao cimento, à aspereza de um local seco e hostil. 

    "Como seria possível melhorar a convivência daquelas mulheres? O que poderia ser feito com quase nada, durante duas horas semanais, em um ambiente árido e hostil?" p. 29
    Não foi uma tarefa fácil. O ambiente da cadeia não é o que se pode chamar de acolhedor e Flávia teve que conciliar os sentires complexos que esse ambiente hostil lhe proporcionava com a ousada tarefa de trazer um pouco de qualidade de vida para essas mulheres. 

    "Ao me aproximar da cela de isolamento, senti pela primeira vez o cheiro de humanidade trancada, concentrado em sua última escala. Um odor forte, azedo e ácido, que mistura o cheiro de gente ao do cigarro, das doenças e das tristezas, para só então formar o singular cheiro do confinamento. Não que fosse melhor ou pior que os outros maus cheiros da vida, mas apenas porque era insuportavelmente inesquecível." p. 43

     No período em que passou na Cadeia de Santos, Flávia também teve a oportunidade de conviver com as carcereiras e de mostrar um pouco da vida e das dificuldades encontradas por essas mulheres que limitam entre a vida na prisão e o "lado de fora" e que todos os dias expõem-se aos riscos de rebeliões internas, também sendo tragadas pelo cinza que circunda a vida no cárcere.

    Além da experiencia na prisão e das grandes dificuldades que todos nós já conhecemos um pouco, a riqueza maior contida em Flores do Cárcere é a possibilidade de falar das pessoas e das relações que são travadas e cultivadas dentro da prisão. O enfoque trazido pela autora está acima de tudo nas relações humanas. E é desta forma que ela elabora a sua narrativa:
    " Meus dias na Cadeia Feminina de Santos foram inundados pela consciência de que nunca haverá uma receita a seguir para as relações.  Porque são humanas. Porque são inéditas." p. 233
    É um livro forte e ao mesmo tempo sensível e delicado. Uma leitura fluida, interessante e bastante proveitosa. O livro tem uma capa linda, uma diagramação muito boa e capítulos curtos, o que facilitou ainda mais a leitura. Recomendo muito!

    Um pouco mais sobre a autora:

     Flávia Ribeiro de Castro nasceu em São Paulo, em 1962. Formada em Administração de Empresas pela Universidade de São Paulo, aplica os conhecimentos nos campos educacional e social. Trabalhou com crianças carentes, jovens com direitos violados e adultos analfabetos. Atuou em abrigos, favelas e pequenas comunidades rurais. Foi diretora de escola formal e coordenadora de Educação de Jovens e Adultos, no município de São Sebastião.Em São Paulo foi diretora do Abrigo Butantã e membro do conselho da Cruzada Pró-Infância. Em 2006 fundou a ONG Educaalma que desenvolve projetos de Educação para a Convivência.

    Confira os capítulos inciais em: http://floresdocarcere.com.br

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